Quarta-Feira, 24 de Abril de 2024

Tradição centenária

Empresa fabrica cristais com processo totalmente artesanal e com técnicas utilizadas desde o Egito antigo. Por Pedro Zuccolotto

Foi em fevereiro de 1965 que Mario Seguso, nascido na Ilha de Murano, Veneza, inaugurou a Cristais Cá d’Oro, empresa focada em peças de vidro artísticas. Seguso descende de uma das mais antigas famílias de mestres vidreiros, estabelecidos desde 1292 em Murano e desde 1954 no Brasil. O nome Cá d’Oro, inclusive, foi escolhido em homenagem ao palácio homônimo de Veneza que, em tradução livre, significa Casa de Ouro.

A empresa utiliza mão de obra totalmente manual, com técnicas que datam dos antigos vidreiros do Egito, mas com auxílio da tecnologia contemporânea. Atualmente, a Cristais Cá d’Oro conta com a terceira geração da família Seguso em terras brasileiras em sua equipe administrativa. Conversamos com Guilherme Seguso, neto do fundador, sobre o processo de produção dos cristais.

Guilherme Seguso e seu avô Mario Seguso.

O que define um cristal como Cristal de Murano ou do tipo Murano?

O cristal de murano tem um registro internacional, um doc de determinação de origem controlada. São as peças feitas na Ilha de Murano, na Itália. É igual Champanhe, queijo Parmesão, presunto Parma, são produtos que são denominados a partir do momento em que são feitos em determinado lugar. O tipo Murano é porque ele a mesma técnica, as mesmas formações químicas e faz peças nesse estilo usando o mesmo tipo de produção. É isso que define o tipo Murano: 100% artesanal.

Quais são as características que atestam a qualidade do cristal?

A qualidade do cristal vai ser testada principalmente pela transparência, pelo brilho, dureza e tudo mais. Na verdade, tudo que é feito artificialmente é um vidro. Aí depois que ele é beneficiado através da adição de óxidos e de outros elementos que dão mais brilho, mais transparência. Como ele é muito usado para decoração e objetos mais artísticos, aqui no Brasil é muito conhecido como cristal. Aí tem várias vertentes desse material. Tem alguns que têm adição de chumbo, outros de potássio, cada empresa, cada tipo de trabalho beneficia de um jeito. Mas os principais aspectos que atestam qualidade são brilho e transparência.

Quais são as principais matérias-primas do cristal?

A matéria prima básica é sempre a areia. A sílica, com bastante pureza e beneficiada para tirar todas as impurezas. Depois tem a barrilha, calcário e alguns outros elementos que dão mais brilho e mais transparência ao material.

Como são produzidos e criados os pigmentos?

As cores são obtidas todas através da fusão, no nosso caso. A gente tem a base transparente, o cristal, e nessa base adicionamos óxidos e cada cor tem um óxido diferente uma composição diferente, 100 gramas de um elemento, às vezes um kilo de outro elemento. Quando funde a 1.400 graus toda a mistura fica naquela coloração. É tudo feito na própria massa mesmo, você faz uma base transparente, joga o pó no meio, bate para misturar bem e depois derrete.

As peças são artesanais? Como conseguem reproduzir os mesmos itens?

As peças são todas 100% artesanais, desde a produção, lapidação. tudo. Para manter o mesmo modelo, sempre levamos uma amostra para a fábrica, tiramos as medidas e juntamos essa dimensão. Acaba dando uma pequena variação entre todas as peças, mas atinge um padrão bem razoável. E tem também umas linhas um pouco mais em conta, que são muitas peças soprada na forma mesmo, você sopra dentro de um molde que o lado externo é igual. A espessura, a coloração acaba sendo sutilmente diferente porque corre o material na mão, mas é bem padronizado.

Fale sobre as principais questões tecnológicas que envolvem o processo de fabricação das peças.

Tecnológico a gente tem muito pouco. É um trabalho que a gente optou por ser, uma fábrica artística, não tem muita tecnologia envolvida. Têm as tecnologias de resfriamento das peças, materiais de lapidação, fornos com mais eficiência energética, materiais que compõem os fornos melhores. O conceito que usamos é muito parecido com o usado mil anos atrás, o ferramental é muito parecido. É lógico, no meio disso, tem uma tesoura, aí surge uma tesoura com ponta redonda, outro tipo de tesoura, são variações de ferramentas, mas a parte tecnológica não tem maquinário envolvido, sabe? Maquinário com automatização. 

Como são feitas as embalagens e o transporte para garantir a integridade da peça até o consumidor final?

A embalagem é feita em seda, plástico bolha, colocada em caixa de papelão bem protegido e enviado pelo correio. Quando a peça é mais fina, fazemos uma estrutura dentro da caixa, com uma caixa dentro de outra. Temos raríssimos casos de quebra em transporte.

Quais são as principais dificuldades em toda a cadeia produtiva da Cristais C’Adoro?

A principal dificuldade acho que é a questão de, como no Brasil não tem muita tradição ou muitas fábricas, a principal dificuldade é conseguir os materiais. Todos o ferramental que a gente usa, materiais mesmo, às vezes matéria prima, muita coisa tem que ser importada, discos abrasivos, canas de vidreiros, tudo praticamente tem que vir de fora, então acho que essa é a principal dificuldade da cadeia produtiva. Precariedade do acesso a equipamentos, luvas, tudo praticamente. Tem aqui no Brasil, mas às vezes não é tão específico para o nosso trabalho.

Fale sobre a grande remodelação pela qual passaram as instalações da Cá d’Oro em 2004

Em 2004, que foi um ano antes de completar 40 anos, era uma época em que o Brasil se encontrava em outra situação. Economia estava bem mais segura, vamos dizer, a gente conseguia ver mais à frente, e acabamos trazendo fornos de fora, equipamentos, ferramentas, tudo, que deu um salto grande no controle de qualidade das peças e várias outras coisas. Então foi mais isso, trouxemos equipamentos construídos com materiais melhores, maçaricos melhores, máquinas de lapidação melhores que permitiam fazer outros tipos de produtos que a gente às vezes não conseguia fazer tamanhos maiores… foi mais isso. Foi uma questão de remodelação nos equipamentos usados dentro do processo produtivo.

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