Reforma de apartamento busca reorganizar os espaços para um melhor aproveitamento do espaço, da luz e da ventilação. O resultado é um conjunto equilibrado que dá à célula do radicional edifício da década de 1960 um viés hipermoderno. Por Pedro Zuccolotto. Fotos por Nelson Kon.
Em sua fachada principal, com cerca de 26 metros de comprimento, as vigas e pilares aparentes deixam transparecer a técnica construtiva utilizada e a plasticidade do concreto. Internamente, as grandes aberturas dos tradicionais muxarabis à Alameda Ministro Rocha de Azevedo, no Jardim Paulista, em São Paulo, são o ponto de destaque. Formam um grande pano de vidro e enquadram a cidade, permitindo ótimo aproveitamento da iluminação e ventilação natural, enquanto o fechamento com treliças de madeira possibilita o controle de luz.
Estamos falando do edifício Antônio Augusto Correia Galvão, localizado nas proximidades da Avenida Paulista em São Paulo e projetado em 1964 pelos arquitetos Alberto Botti e Marc Rubin está. Muito singular, ele utiliza muxarabi e possui uma implantação recuada em relação à calçada. Sua morfologia é diferente, há poucos materiais de acabamento. Recentemente, um de seus apartamentos passou por uma reforma, protagonizada por Piratininga Arquitetos Associados e Bruno Rossi Arquitetos.
Briefing
A reorganização dos espaços otimiza e potencializa as qualidades do desenho original, ampliando a iluminação e as possibilidades visuais através das novas aberturas e valorizando a circulação. Uma ousadia proposta pelos donos do apartamento foi a possibilidade de circular entre os quartos e as salas junto das janelas da fachada principal, criando um circuito excepcional para a família. Criar espaços de qualidade foi o objetivo em cada elemento pensado.
Estrutura
A concepção estrutural exposta na fachada é convocada a continuar sua narrativa também no interior do apartamento. Quando demolido o forro, é revelada a beleza do sistema modular em concreto armado, que vence pouco mais de 12 metros com pórticos e uma grelha de concreto e permite a flexibilidade de ocupação do andar tipo, sem nenhum pilar interno. Com aproximadamente 320 m² de área útil, a setorização da planta original separa o apartamento em duas alas: o setor da fachada principal abriga os dormitórios, espaços sociais e não apresenta prumadas hidráulicas, enquanto a área dos fundos recebe os serviços, banheiros e cozinha. Isto posto, a releitura da organização da planta manteve e reafirmou o conceito original em relação à divisão hidráulica.

Hemisférios
O armário também tem a função de demarcar a divisão de “dois hemisférios”: o lado voltado para os ambientes sociais e de dormitórios, na fachada principal, mais urbano e marcado com a recuperação do taco de madeira; o outro, de serviços e áreas molhadas, que se remete ao trabalho, ao fazer, com o piso de ladrilho hidráulico, com cores e formas geométricas. A beleza do trabalho manual também é encontrada no notável painel Panacea Phantastica da artista plástica Adriana Varejão, que reveste a parede da cozinha.
Ponto central
A espinha dorsal do projeto é a estante suspensa do piso com 26m que conecta o apartamento de ponta a ponta e se apresenta como um mobiliário estrutural para organizar a circulação e a divisão dos espaços. Sua estrutura principal é toda em chapas de aço, tendo seus módulos preenchidos com volumes fechados de marcenaria, a depender do uso. A composição, além de um desenho adequado à exposição de objetos, responde às necessidades de cada ambiente, seja nas salas de estar, jantar, tv ou dormitórios. Surpreende pela movimentação de partes, por meio de rodízio pendurado, para reconfigurar e dinamizar os espaços originais para situações diferentes. Como contraponto aos nichos da estante, o volume revestido com painéis de madeira define a circulação longitudinal, valorizada pela iluminação.
Ventilação e luz
A maior parte das demolições se deu nas áreas molhadas, alterando os ambientes e garantindo a luz natural e ventilação cruzada. É o caso da cozinha, agora na fachada posterior. As demolições também permitiram maior interação entre cozinha e espaço social, já que esses ambientes passam a ser separados apenas por painéis retráteis, criando duas fachadas de luz e ventilação. Os convencionais halls de elevadores e o hall interno foram integrados espacial e visualmente, com a oportunidade de trazer iluminação natural para o centro do edifício.
Ficha técnica
Arquitetura do edifício: BOTTI RUBIN Arquitetos 1958-1964
Projeto de reforma: Piratininga Arquitetos Associados e Bruno Rossi Arquitetos
Conclusão: 2019
Projeto de luminotécnica: LUX Projetos – Ricardo Heder
Consultoria de acústica: Harmonia Acústica
Projeto de climatização: Master Plan
Consultoria de estrutura: Aluízio D’Ávila – Eng. Luis Miguel Casella Barrese
Projeto de instalações elétricas: PKM Engenharia
Projeto de instalações elétricas hidráulicas: Usina
Projeto de decoração: Manaa Arquitetura
Construção: DM Engenharia
Fornecedores
Ladrilho hidráulico: Dalle Piagge
Marcenaria: Araucária
Marmoraria: Montblanc
Louças sanitárias: Deca
Merais sanitários: Deca
Luminárias: Reka / Lumini
Serralheria: Max fer
Aarmários cozinha/closet: Securit
Matéria publicada originalmente na revista aU.