Terca-Feira, 26 de Setembro de 2023

Interferência artística: a bela arte de Rosana Grimaldi

Diversos elementos da decoração podem influenciar as pessoas. Desde cores, temperatura da luz e até mesmo pinturas e murais. Rosana Grimaldi se dedica a decorar ambientes e fachadas com a pintura. “Ela é feita justamente para interferir positivamente no cotidiano de quem reside naquele espaço”, explica. O ArqXP conversou com a artista sobre sua carreira, processo artístico e influências. Confira abaixo!

ArqXP: Como você começou no ramo artístico dos murais e pinturas decorativas?

Rosana Grimaldi: Eu fiz um longo percurso até chegar a essa atividade profissional. Desde muito cedo já gostava de desenhar e pintar. Na adolescência, fiz um curso técnico de Desenho de Comunicação que me permitiu ingressar no mercado de comunicação ainda muito jovem, aos 16 anos. Até os 24 anos trabalhei em alguns estúdios de design gráfico, em agências de publicidade, em editoras e também fazia ilustrações como freelancer. Em paralelo a isso, me envolvi em grupos de teatro e me apaixonei por cenografia chegando a participar de grandes montagens teatrais com os diretores Marco Nanini, Cacá Rosset, Celso Frateschi, entre outros. Até hoje me pergunto como tinha tanta energia para dar conta de tantas atividades ao mesmo tempo! Me formei em Artes Visuais e aos 24 anos fui convidada para trabalhar na Editora Abril e lá permaneci por 20 anos. Na Editora Abril, me senti atraída para o setor de revistas de decoração e nas revistas Casa Claudia Luxo e Casa Claudia, onde trabalhei como editora de arte, tive a oportunidade de participar de belas produções fotográficas, algumas premiadas no Prêmio Abril de Jornalismo. Foi uma época maravilhosa em que a editora, líder no mercado editorial, não economizava na elaboração das reportagens e podíamos criar à vontade. Como as revistas de decoração são fontes de inspiração visual, havia uma exigência pelo primor. Eu participava de todo processo de elaboração de uma reportagem que partia de uma ideia, passava por um esboço, se materializava dentro de um estúdio de fotografia, era capturada pelas lentes do fotógrafo, depois transferida para as páginas de uma revista, até chegar nas mãos do leitor, despertando o desejo de transformar seu espaço em um ambiente mais acolhedor. 

Após esses anos, o setor de comunicação editorial entrou numa grande crise e algumas revistas tiveram suas atividades encerradas. Perante essa nova situação em que eu me encontrava, tendo que redirecionar as minhas escolhas, quis resgatar o fazer artístico através das tintas. Busquei algo que fosse divertido e fora de um ambiente corporativo. Então resolvi voltar a pintar cenários, mas dessa vez, dentro da casa das pessoas. Desta maneira, continuei aliando os meus saberes e já que tinha tido grande experiência em decoração e sabia pintar, passei a considerar os espaços das pessoas como cenários e as paredes como grandes telas de pintura.

ArqXP: Quais são suas principais inspirações artísticas?

RG: A natureza para mim é uma inesgotável fonte de inspiração, nela há tudo que preciso como referência: cores, texturas, padronagens. Sou uma observadora de paisagens, insetos, animais, plantas e tento sensibilizar as pessoas para se reconectarem com a beleza que está a nossa volta. 

A contemporaneidade também é muito rica em referências. As pinturas saíram de dentro dos museus e ganharam as ruas. Gosto de observar as várias linguagens da street art, essa sopa de cor. Numa cidade, é mais agradável viver assim rodeado de arte. De certa forma, esse movimento artístico me contagiou e tento contribuir também para tornar o mundo mais colorido.

ArqXP: Como um quarto com pintura decorativa pode mudar a rotina de quem vive na casa?

RG: Qualquer elemento decorativo pode influenciar positivamente ou negativamente alguém. Pode parecer estranho, mas muitas pessoas não se dão conta do que têm em suas casas. A casa deveria ser um território de seu próprio domínio, o lugar onde fazemos as nossas escolhas e imprimimos o nosso gosto. Mas muita gente simplesmente escolhe ou encomenda objetos para somente ocupar um lugar na estante até passarem despercebidos depois de um tempo. 

Uma grande pintura na parede não pode passar despercebida. Ela é feita justamente para interferir positivamente no cotidiano de quem reside naquele espaço. Portanto, é importante que seja bonita, agradável e que tenha uma identificação com quem vai conviver com ela. Dentro de um quarto, a pintura é uma maneira de tirar da parede a função de separar ambientes. É possível, por exemplo, criar uma sensação de expansão e profundidade com uma cena de praia e acordar relaxado à beira-mar todos os dias.

ArqXP: Existe algum trabalho que te marcou mais? Qual e por que?

RG: Eu tenho muito carinho por uma pintura que fiz para uma criança chamada Alice. A menina tem o hábito de viajar com os pais, mas mora em um apartamento. Os pais perceberam que ela não conseguia permanecer por muito tempo lá sem que pedisse para descer ao playground e tinha dificuldade em dormir sozinha. Ela vivia pedindo para ir à praia onde se sentia bem e feliz. Para ela elaborei uma pintura retratando o mar em tons calmos e um castelo de areia para dar vazão a sua imaginação. Depois disso, os pais me disseram que ela não queria mais sair de lá e passou a dormir sozinha, ou melhor, acompanhada de peixinhos.

ArqXP: Qual é, para você, a importância da arte na casa?

RG: A arte na casa é tão importante como a refeição de todo dia. O contato diário com o belo, com a harmonia de cores e formas torna o dia a dia mais palatável. A casa deve ser um local de acolhimento e ter a função de regeneração, além disso deve ter a identidade de quem reside nela. A arte busca criar essa identidade com seu interlocutor, busca estabelecer uma mensagem, uma comunicação com quem a aprecia. Quando alguém leva para dentro de casa uma obra arte, está explicitando o que está no seu íntimo. Olhar para ela todos os dias reforça os valores a ela atribuídos.

ArqXP: Qual é a técnica que você usa?

RG: As técnicas que uso são as mais variadas, muitas delas aprendidas em cenografia. Faço uso de materiais como pincéis, rolinhos de pintura, esponjas, estêncil. O objetivo das técnicas é conseguir um grande efeito com agilidade pois não dá para interferir no dia a dia das pessoas por muito tempo. As tintas, na maioria das vezes, são as mesmas usadas para pintar paredes, acho perfeitas pois não produzem cheiro forte. 

ArqXP: Como você discute o briefing com o cliente? Dá sugestões da arte antes de executá-la?

RG: Eu procuro reunir o máximo de informações em relação ao que gostam, atividades que lhes agradam, sobre as cores preferidas, pergunto quais das minhas pinturas mais gostaram. Peço para me mandarem fotos do ambiente que receberá a pintura, assim eu posso perceber o estilo de decoração e faço a pintura de maneira que se harmonize com o espaço. Como tenho domínio dos programas gráficos, geralmente eu faço uma simulação sobre a foto, assim, quando o cliente recebe o projeto, consegue visualizar melhor como será o resultado final.

ArqXP: Em espaços educativos (escolas, berçários), qual a importância dos murais?

RG: É muito importante o indivíduo ter contato com a arte desde cedo. Os murais estimulam a criatividade, tornam o ambiente divertido, despertam o imaginário criando um universo lúdico onde a criança pode se inspirar para se expressar além da linguagem verbal e escrita. Mas é preciso adequar a pintura para cada espaço educativo. Em berçários, como os bebês precisam de períodos de sono, a pintura deve ter tons mais suaves pois cores vibrantes não propiciam o relaxamento. Já em outras áreas como páteo, corredor, brinquedoteca está liberado o uso de múltiplas cores e formas. Acredito que quem cresce com o estímulo das artes em geral torna-se um adulto mais feliz, pois saberá interpretar melhor o mundo a sua volta e lidar com as suas emoções procurando maneiras de expressá-las. 

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