Sexta-Feira, 19 de Abril de 2024

Grafeno: o material do futuro

Tão ou mais revolucionário que o plástico e o silício, o grafeno é o material mais resistente já encontrado. Consiste numa folha plana de átomos de carbono densamente compactados em uma grade de duas dimensões.

Fotos: Freepik

O mais forte, mais leve e mais fino (espessura de um átomo) material que existe. Se empilhadas, 3 milhões de camadas de grafeno têm a altura de apenas 1 milímetro. Já imaginou a transformação que este material pode proporcionar aos diversos setores da construção civil? “Nós temos recebido muitas demandas da engenharia, com ênfase na civil com as aplicações do grafeno. Os campos de aplicação passam pelo concreto, materiais como revestimentos, tintas, materiais polímeros, metais”, explica o Prof. Dr. José Augusto Brito, diretor executivo do Centro Avançado de Pesquisas em Nanotecnologias, Nanomateriais e Grafeno (MackGraphe), maior laboratório de pesquisas em grafeno na América Latina.

          “O grafeno é um material bidimensional formado de carbono. Tem propriedades químicas e físicas extraordinárias, com um potencial de aplicação em áreas diversas, desde da indústria de revestimentos até a eletrônica”, explica o Prof. Dr. Antônio Hélio Castro Neto diretor do Centre for Advanced 2D Materials de Singapura. O pesquisador, que foi responsável técnico pelo grupo que deu origem ao MackGraphe, atua num dos principais pólos de pesquisa e desenvolvimento do material, na Ásia.

          Em 2010, o Prêmio Nobel de Física foi atribuído a Andre Geim e Konstantin Novoselov da Universidade de Manchester por experiências inovadoras em relação ao grafeno. À época, publicou-se no portal G1: “como material, o grafeno completamente novo – não só o mais fino já obtido, como também o mais resistente. Como condutor de eletricidade, é tão bom quanto cobre. Como condutor de calor é melhor do que qualquer outro material. É quase completamente transparente, mas ao mesmo tão denso que nem mesmo hélio, o menor dos átomos de gás, pode passar por ele”.

          Mas o termo grafeno foi proposto a partir da incorporação do sufixo -eno à palavra grafite pelo químico alemão da Ludwig-Maximilians-Universität de Munique Hanns-Peter Boehm. O pesquisador foi pioneiro no estudo do material e foi quem descreveu as folhas de carbono de forma inédita em 1962.

Diversas aplicações

          As aplicações do grafeno na indústria têm se dado de diferentes formas. Um destes campos é o aprimoramento de sistemas de baterias, aplicados desde objetos pequenos, como smartphones, até equipamentos maiores, como automóveis. A Samsung prevê lançar em 2021 um novo modelo de telefone celular que substituirá o uso do grafite tradicional pelo grafeno. A tecnologia promete acelerar o tempo de carregamento das baterias de maneira significativa.

Por ser um excelente condutor, o grafeno pode ser a chave para resolver a principal limitação dos carros elétricos. A montadora italiana Lamborghini tem trabalhado desde 2017 em parceria com o Massachusetts Institute of Technology (MIT) na incorporação do material para aprimorar o processo de carregamento dos automóveis. A estrutura, fina como papel com película de grafeno e nanotubos de carbono, permitirá a construção de um capacitor de maior volume por área e maior capacidade de armazenamento. Isso daria maior autonomia aos veículos.

            “A indústria 4.0 se beneficia de novos nano-materiais como o grafeno, que tem propriedades superiores aos materiais convencionais tais como maior resistência estrutural, melhor performance elétrica e térmica, e menor desperdício de energia levando a uma economia sustentável’, explica Castro Neto. Segundo o pesquisador, esta capacidade de manipular a material em escala nanoscópica abre portas para tecnologias revolucionárias e disruptivas, como se tem assistido nas mais diversas formas de aplicação do grafeno.

Um grupo de pesquisadores do Reino Unido descobriu uma maneira de incorporá-lo no concreto, aumentando consideravelmente a resistência do material e sua impermeabilidade. A equipe da Universidade de Exeter afirma que o material resultante da experiência é duas vezes mais forte e quatro vezes mais resistente à água do que os concretos existentes. A técnica usa a nanotecnologia para suspender fragmentos atomicamente finos de grafeno na água usada na mistura de concreto.

            A Prof. Dra. Patrícia Barbosa da Silva, engenheira e doutora em Engenharia de Transportes pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora da Universidade Presbiteriana Mackenzie, fala sobre a aplicação do grafeno em seu campo investigativo, a pavimentação. “Estamos trabalhando numa pesquisa para aplicação do grafeno em materiais estabilizados com adição de cimento. A utilização na verdade é do óxido de grafeno, derivado do grafeno. Ele pode aplicar tanto no concreto quanto em materiais estabilizados que usem cimento. De modo geral, essa forma de aplicação pode ser vista na construção civil em todos os processos que envolvam algum tipo de adição de cimento”, explica.

A pesquisadora conta ainda que há intenção, por parte da Universidade, de desenvolver aplicações do grafeno em misturas asfálticas. “A iniciativa teria como missão reduzir a temperatura dessas misturas, produzindo assim misturas asfálticas chamadas mornas”. No asfalto, ainda segundo Barboza, o grafeno atuaria como uma aditivo modificador das características de viscosidade. Isso contribuiria ainda mais para a redução das emissões de gases definidas no Protocolo de Quioto. “No concreto e nos demais materiais com cimento Portland, o que se consegue observar é que a adição de grafeno acelera os ganhos de resistência”, completa.

O MackGraphe

Químicos, físicos e engenheiros compõem a equipe de pesquisadores que vai de alunos de iniciação científica a pós-doutorandos. O investimento de R$ 100 milhões já mostra o retorno a partir do estreitamento de relações entre o centro de pesquisas e a indústria. Um dos andares do edifício-sede, que fica no campus de Higienópolis da Universidade Presbiteriana Mackenzie, foi pensado para abrigar uma incubadora de empresas ligadas às aplicações do grafeno e de outros nanomateriais 2D. O local será a chave para a criação de startups que viabilizarão a aplicação prática das pesquisa desenvolvidas. Um exemplo é a empresa AutoSicence Technologia, que desenvolve sistemas e equipamentos inovadores para processos laboratoriais e industriais.

A startup viabilizada a partir do PIPE (Programa de Investimento em Pequenas Empresas da FAPESP) trabalha na aplicação do grafeno na indústria eletrônica. Outra startup alocada no MackGraph é a NanoUp, que foca na reciclagem de polímeros a partir da adição de nanotecnologias. “O MackGraphe é um empreendimento ousado com olhar no presente e futuro, na fronteira do conhecimento, dentro do conceito de Indústria 4.0, onde há a questão de inovação aberta. Neste conceito de cyber físico entra o grafeno 2D com a espessura do átomo, com superfície ampla e também características e aplicabilidades muito abertas. Aqui, trabalha-se o conceito da nanotecnologia, diferentemente do que tipicamente a indústria clássica faz. Dependendo de cada área, um universo imenso se abre”, afirmou em entrevista o diretor executivo do MackGraphe, professor Dr. José Augusto Brito.

Entrevista

Professor Dr. José Augusto Brito, diretor executivo do MackGraphe

Responsável pela gestão do Centro Avançado de Pesquisas em Nanotecnologias, Nanomateriais e Grafeno (MackGraphe). É ligado à Reitoria da Universidade e está integrado à Escola de Engenharia Mackenzie, ao Ecossistema de Inovação da Universidade e ao Mackenzie Soluções (Setor de Negócios da Instituição junto ao Mercado).

Fale-nos sobre o MackGraphe.

O MackGraphe é um empreendimento ousado, com olhar no presente e futuro, na fronteira do conhecimento, dentro do conceito de Indústria 4.0, onde há a questão de inovação aberta. Neste conceito de cyber físico entra o grafeno 2D com a espessura do átomo, superfície ampla e também características e aplicabilidades muito abertas. Aqui, trabalha-se o conceito da nanotecnologia diferentemente do que tipicamente a indústria clássica faz. Dependendo de cada área, um universo imenso se abre.

Por que estudar o grafeno?

A base de todo este campo é o carbono na forma do grafite. Grafita é o que se extrai do solo, grafite é o carbono apurado. Tudo o que tem macropropriedades tem carbono em sua composição. O Mackenzie, com uma equipe de pesquisadores com experiência global, definiu a ideia de desenvolver pesquisas sobre o grafeno nas áreas de física e química. Em 2012, com a anuência e apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), viabilizamos a construção do centro. À época, observou-se inclusive o estado da arte do assunto no mundo. Com o MackGraphe, demos um passo pioneiro para a geração de renda, a indústria e a sociedade.

Fale sobre o centro propriamente dito.

O centro foi inaugurado há cerca de 3 anos, inserido no ecossistema das principais instituições que têm pesquisa nesta área no Brasil e no mundo. Trabalhamos com algo essencial para o nosso país, que tem recursos naturais, mas precisa de geração de recursos humanos. Em Israel ou na Coréia do Sul, faltam recursos naturais, mas há recursos humanos. O centro visa desenvolver pessoas, pesquisadores, com conhecimento. Visa acelerar os ecossistemas de inovação, fomentando dentro e fora da instituição esses valores. Visa orientar tudo o que é produzido na indústria, o que gera riqueza na ponta.

Onde mais se pesquisa sobre o grafeno?

A China é um ponto fora da curva. Parece outro planeta. Porém, existe a principal organização do mundo, que está investindo forte e fica na Coréia do Sul. Eles atuam por meio da Samsung. De longe é o maior qualificador de pessoas quando se fala de grafeno. Singapura tem outro centro notável, associado a nós, onde está o Professor Doutor Antônio Hélio Castro Neves (veja entrevista no box). Nós temos recebido muitas demandas da engenharia, com ênfase na civil, com as aplicações do grafeno. Os campos de aplicação passam pelo concreto e materiais como revestimentos, tintas, materiais polímeros, metais. Entra pela área da medicina, esporte, farmácia, esporte, naval, automobilística. Oportunidade de inovação na indústria.

Entrevista

Professor Dr. Antônio Hélio Castro Neto diretor do Centre for Advanced 2D Materials de Singapura.

Professor do Department of Material Science Engineering, Department of Physics a Department of Electrical and Computer Engineering da Universidade Nacional de Singapura (National University of Singapore).

Fale-nos, de maneira geral, sobre o MackGraphe e seu envolvimento com o projeto.

A ideia do MackGraphe foi gerada em Singapura em 2012 durante a visita do Reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Prof. Dr. Benedito Aguiar Neto, ao centro de pesquisa do qual sou diretor. O Prof. Benedito ficou tão entusiasmado com o que viu em Singapura que propôs ao Mackenzie envolvimento com a pesquisa do grafeno. Com isso, o Prof. Dr. Eunezio Thoroh de Souza, que também estava nessa visita à Singapura, sugeriu que escrevêssemos uma projeto de pesquisa para a FAPES, chamado de São Paulo Excellent Chairs (SPEC).

A proposta foi aprovada com um investimento na ordem de R$ 10 milhões, da qual fui o coordenador e investigador responsável. O projeto SPEC foi usado para compra de equipamento, formação de pessoal e manutenção do MackGraphe por vários anos. Além disso, vários dos pesquisadores do Mackgraphe vieram a Singapura, onde foram educados na área do grafeno e materiais bidimensionais.  

Conte-nos, tecnicamente, a importância do grafeno e da pesquisa deste material.

O grafeno é um material bidimensional formado somente de carbono que tem propriedades químicas e físicas extraordinárias com um potencial de influenciar muitas áreas industriais diferentes, desde da indústria de revestimentos até a eletrônica.

De que forma o Centre for Advanced 2D Materials and Graphene Research Centre se relacionam com o MackGraphe?

O CA2DM foi o berço formador dos pesquisadores do Mackgraphe.

Em que medida o Grafeno se encaixa no conceito de Indústria 4.0?

A indústria 4.0 se beneficia de novos nano-materiais como o grafeno que tem propriedades superiores aos materiais convencionais tais como maior resistência estrutural, melhor performance elétrica e térmica e menor desperdício de energia, levando a uma economia sustentável.   

Quais são as possíveis aplicações do grafeno na indústria da construção civil? O senhor pode citar exemplos?

O grafeno tem sido usado na indústria da construção civil de várias maneiras, como aditivo no concreto de forma a fazer o concreto menos quebradiço, mais resistente à água e a ataques químicos e também como aditivo em tintas e revestimentos para diminuir a corrosão e melhorar o gerenciamento de calor.  

Propriedades do grafeno

  • Força: 200 vezes mais forte que o aço;
  • Espessura: o material mais fino já descoberto, é 1 milhão de vezes mais fino que um fio de cabelo;
  • Impermeável: é impermeável a tudo, exceto à água, o que pode ajudá-lo a filtrá-la;
  • Plasticidade: completamente maleável e flexível;
  • Condutividade: é o material mais condutivo já descoberto, 100 vezes mais que o cobre;
  • Bidimensionalidade: primeiro material bidimensional descoberto.

O grafeno é considerado o futuro da tecnologia e da construção. Isso se dá devido às suas propriedades únicas, se sobressaindo as de outros materiais. Confira abaixo as possíveis aplicações na construção civil.

*Conteúdo publicado originalmente na edição 252 da Revista Techne.

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